18 de mai. de 2011

Um Clarão nas Trevas

Wait Until Dark. EUA, 1967, 108 minutos, drama. Diretor: Terence Young.
Para mim, trata-se de uma das melhores interpretações de Audrey Hepburn e eu não hesitaria muito em colocá-la como uma das minhas três preferidas!

Se perguntassem a mim que personagem de Audrey Hepburn é a mais marcante, eu não hesitaria em responder: Susy Hendrix, de Wait Until Dark. Se me perguntassem que filme estrelado por essa atriz é o meu preferido, eu teria dúvidas entre alguns títulos – entre eles, Um Clarão nas Trevas. Começo assim minha resenha porque realmente penso que essa produção seja um marco na carreira dessa atriz.

Usualmente, os títulos fazem alusão a algum elemento da obra – é necessário que seja assim para que se estabeleça uma relação de coerência entre o título e o assunto abordado na história. Ainda que o título nacional não seja uma tradução literal do original – e, conseqüentemente, carregue uma intenção diferente –, penso que ambos os títulos são eficientes na sua finalidade de retratar o drama de Susy, que ficou cega recentemente e que busca sua independência, já que seu marido se recusa a deixá-la se tratar como uma mulher debilitada. As “trevas” ou a “escuridão” – do original dark – acontecem na noite em que, sozinha em casa, Susy é surpreendida por bandidos que buscam uma boneca cheia de heroína que seu marido trouxe para casa por engano.

O primeiro pensamento que o espectador tem é muito óbvio. Sabe-se que bandidos entram em casa e fazem renderem-se até mesmo homens capazes de enfrentá-los sem grandes esforços – como então uma pessoa recém-adaptada à sua deficiência visual é capaz de impedir três homens? É evidentemente que o filme, diferentemente desse pensamento potencial do espectador, caminha contrário ao senso-comum e a história apresentada é embasada numa série de argumentos que vão construindo a narrativa delicada dessa trama. Primeiro: os bandidos não são estúpidos e agem racionalmente; precisam considerar inúmeros fatores, como o fato de a boneca não estar mais nada casa e a mulher cega recusar-se a ajudar caso esteja ameaçada. Segundo: a vigente debilidade de Susy – como acontece com a maioria das pessoas – aguça os outros sensos, permitindo então que, embora não veja efetivamente, ela tenha uma ótima noção de sons, cheiros e, indiretamente, veja eficientemente. Terceiro: o roteiro se ocupa de expor argumentos que constroem a história através da dubiedade – os bandidos apresentam perigo a Susy ou ela, já consciente do risco que corre, oferece perigo a eles? Todos os bandidos são realmente ruins ou são intercambiáveis a ponto de, no final, ceder à causa de Susy?

Para mim, o auge do filme está na associação entre roteiro, atuações e direção. Equiparo-os porque os enxergo no mesmo nível de eficiência – e são todos muito bem desenvolvidos ao longo da trama. A respeito do roteiro, como já comentei, é muito eficaz na composição dos personagens e das situações propostas ao longo do filme – nada soa incoerente ou exagerado, nada está solto e as propostas (roubo da boneca) e contrapropostas (reação da personagem ao roubo) encaixam-se muito bem, completando-se. Terence Younger, mais conhecido por alguns filmes da série 007, não erra na direção: concentra-se em manter o clima do filme do começo ao fim, permitindo ao espectador bons momentos de entretenimento e bons momentos de clímax intenso. Nas mãos de outro diretor, o terror experimentado por Susy Hendrix se tornaria um show ridículo de sustos; em suas mãos, percebemos o desespero no qual a personagem se encontra e achamos as situações deveras reais – e exatamente por isso ainda mais perturbadoras.

Creio, porém, que o maior elogio deva ir à Audrey Hepburn, que se dedicou intensamente a essa produção. Não se pode negar isso quando a vemos em cena: sua participação nesse filme serviu para que interrompesse categoricamente sua carreira de muitos filmes de sucesso para poder então cuidar da família. Interpretando Susy Hendrix, Audrey provou que não é uma atriz de mocinhas delicadas, que vivem principalmente de romance – como Sabrina, do filme homônimo. A atriz, aliás, já havia provado estar associada a personagens de extrema crítica social – Gabrielle van der Mal e Karen Wright, de The Nun’s Story e The Children’s Hour, respectivamente -; com esse filme, porém, ela prova também estar perfeitamente apta para atuar em qualquer gênero, haja vista que nesse único filme ela reúne todos os elementos necessários para definir-lhe como uma atriz excepcional: sabe convencer-nos de que está feliz, de que está triste, de que tem medo e, sobretudo, de que experimenta uma das mais terríveis situações de sua vida. E faz tudo isso com o olhar – qualidade brilhante! Tenho suspeitas de que o Oscar de 1968 lhe fugiu das mãos de modo questionável – estaria Katharine Hepburn mesmo muito mais eficiente em Guess Who’s Coming to Dinner do que Audrey Hepburn em Wait Until Dark?

Se um filme se faz com vários elementos associados, não me restam dúvidas de que essa produção pode ser considerada como uma obra memorável. Todos os elementos confluem para a criação de um filme fantástico e, para mim, é exatamente isso que nos é apresentado: todos nós decerto nos lembraremos da tensão existente na tentativa de “criar as trevas” e de desligar a geladeira da tomada. Quem assistiu ao filme decerto saberá a que me refiro; aos que não viram ainda, recomendo que vejam tão logo que puderem – é um obra inesquecível!

2 opiniões:

Alan Raspante disse...

E eu ainda não vi este. Fiquei super curioso e ansioso para conferir a obra. Excelente post!

Abs.

Cristiano Contreiras disse...

Bom texto mesmo!

Adoro Audrey!

Nunca vi esse filme, mas a maneia como você exalta a interpretação e eficiência na produção me deixou interessado, já estou baixando aqui ele, vejo hoje. abs